Observava-o de longe, os olhos claros transbordando devoção, tão
grande que chegava a ser proibida, doentia. Seus olhos não largavam a figura
dele, não deixavam-no ir. A figura frágil do garoto apanhando lhe ferindo a
alma e incitando a raiva e o ódio que seu ser angélico jamais deveria ter.
Queria protegê-lo, mas não somente, queria mais.
Queria abraçá-lo, amar aquela existência que fizera da sua tão mais viva, queria
mais. Queria, como nunca antes cometer um pecado, se sujar no fel daquele ser,
unicamente por amor. Queria mais.
Era um escolhido de Nathaniel, escolhido a dedo
pelo próprio luminoso, que estava perdendo sua luz, apagando-se pouco a pouco.
Como uma tela branca que se torna turva, sua pureza sendo maculada a cada
segundo, sem que, pudesse evitar. Sua natureza havia sido cruelmente alterada
pela magia mundana daquele ser,
daquele humano, daquela alma sofredora que lhe cativava sem saber
Tu te tornas eternamente
responsável por aquilo que cativas...
Mas ora, como
poderia um humano ser responsável por seu próprio anjo da guarda? Onde já se
viu tamanha heresia?! Era um anjo, da
casta dos mais puros e inocentes, mas, no entanto, estava caindo. Se rendendo,
se corrompendo e pecando. Seria tão grave
assim seu pecado? Pensou por um milésimo de segundo e no instante seguinte
pedia perdão por ser fraco, as lágrimas escorrendo por seu rosto enquanto seus
joelhos tocavam o chão, em seu último ato
de submissão. Sua luz cada vez mais fraca enquanto as lágrimas caíam no
chão. Sua luz sumindo... Até que simplesmente se apagou.
Aquele foi o
último tapa, o último golpe que o agressor desferiu contra seu protegido, pois
no instante seguinte tudo era fogo e o
fogo se tornara tudo, consumindo e queimando o corpo daquele que agora
gritava. Seus olhos estavam tingidos, de
vermelho-sangue do ódio e seu coração chorava baixinho por sua corrupção, mas não importava.
Virou-se, o calor
das chamas não lhe afetando e apenas fitou seu precioso, encolhido contra a
parede, tremendo de medo de tudo que estava acontecendo. Abriu os braços, o
vermelho dos olhos sumindo e dando lugar ao seu azul tão acalentador, sorriu
para aquele ser maravilhosamente sujo
em um chamado delicado, em um “Está tudo
bem” que não precisava ser proferido.
Suspirou ao
sentir o calor dele no seu e abraçou-o, tão forte quanto era capaz. E em
seguida chorou, de amor, de tristeza e de felicidade. Suas lágrimas trazendo
paz àquela alma tão atormentada. Porque
tinha que ser assim? Pensou enquanto apertava-o mais contra si, querendo
gravar em sua essência cada
centímetro de pele daquele ser, querendo fundi-lo a si para jamais o perder. Pena que seu tempo era tão curto.
Era um caído e
como tal seria destruído em breve, enviado ao inferno como assassino que era,
mas naquela hora não se importou. Naquela hora, só lhe importava a respiração
calma que batia contra sua pele e o sorriso doce que tomava os lábios daquele
ser em seus braços. Naquela hora só importava que aquela criatura frágil
sentisse seu amor, que se alimentasse dele, que se purificasse nele. Seu
intenso, proibido e acima de tudo efêmero
amor.
Pois este não tardaria
a sumir.