My heart is not broken.

Posted by Carol Riff On 27.4.12 0 comentários

            A menina entrou na sala e fechou a porta com força, a respiração ofegante de alguém que havia corrido por uns bons minutos. Encostou-se a porta, deixando o corpo escorregar por esta mesma até que estivesse no chão. Respirou fundo, tirando os óculos de armação negra e larga do rosto, a mão tremendo sofrivelmente e as lágrimas que tanto segurara finalmente transbordando.

            Suprimiu os soluços dolorosos que tentavam irromper de sua garganta, não choraria daquela forma, pensou. Não daria a ele exatamente o que ele queria. Podia estar quebrada e magoada, mas seu orgulho se tornaria o pilar substituto que ficara após a demolição de sua confiança.

            As palavras cruéis do outro ainda ecoando em sua cabeça como uma canção macabra, as risadas dos amigos dele e o deboche estampado em seus rosto marcado a ferro em sua memória. Nunca havia se sentido tão pequena e boba, tão idiota e insignificante! Apertou a saia com força, a raiva por conta da humilhação tomando conta de si de forma avassaladora. Berrou alto, sabendo que ninguém ia lhe ouvir, por conta do isolamento acústico que a sala tinha.

            Ergueu-se, ainda sentindo suas pernas tremerem um pouco. No rosto, o rastro do lápis preto que colocara de manhã apenas para parecer mais bonita. Fitou-se no espelho do local, os olhos vermelhos, a maquiagem borrada e a boca inchada. Sorriu amargamente diante da própria aparência, mas não se ateve ao fato, desviando seu olhar para o piano negro que a sala continha.

            Caminhou a passos lentos até o mesmo, os dedos escorregando delicadamente por cada tecla, enquanto um meio sorriso surgia em seus lábios. Sentou-se diante do mesmo, tocando uma das teclas e apreciando o som que lhe trazia um pouco de paz. Fechou os olhos, enquanto os dedos pareciam ganhar vida e passear por conta própria sobre as teclas do piano tecendo uma melodia calma e melancólica.

            Lembrou-se dos últimos acontecimentos, a música se tornando mais forte, mais agoniada, as teclas pressionadas com ainda mais força. Os dedos se movendo habilmente, preenchendo a sala do som que trazia uma aquarela de significados. Jogou a cabeça para trás, o ritmo guiando seu corpo e confortando sua alma, um sorriso doce e calmo nascendo em seus lábios.

            Imersa na melodia, nem sequer ouviu quando a porta da sala foi aberta de supetão, fazendo um alto barulho. O menino parou diante do piano, igualmente ofegante, sorrindo ao notar a expressão serena no rosto da menina. Puxou uma cadeira e assim ficou, admirando o quanto ela era bela daquela forma, o quanto ela parecia forte e confiante enquanto estava atrás daquele piano!

            Quando a música finalmente findou, se entreolharam, não precisando das palavras para entenderem tudo que havia acontecido. E ali mesmo, sem nem proferir nada, firmaram uma promessa, enlaçando os dedos mindinhos com sorrisos calmos.

            Quando o grande dia finalmente chegou, ela não podia estar mais nervosa, as mãos tremendo e a voz ameaçando falhar, mas ele, como sempre, estava ali para lhe tranqüilizar. Disse-lhe palavras de conforto e lembrou-lhe de quanto trabalho haviam tido para chegar ali, afirmando sempre que não iam desistir. Ela assentiu, sentindo um arrepio quando seu nome foi chamado.

            Subiu ao palco, o vestido azul claro com alguns brilhantes reluzindo às luzes do palco. Passou os olhos pela platéia por um momento só, notando o mesmo olhar debochado de antes, mas encontrando logo em seguida o olhar cálido daquele que estivera sempre com ela. Que a impedira de cair no abismo, segurando firme sua mão.

            Respirou fundo quando as luzes se apagaram e deixou os dedos deslizarem pelas teclas brancas. Sorriu e fechou os olhos, perdendo-se no ritmo que ela mesma criou, enquanto sua voz ganhava espaço, abrindo as bocas de muitos que a assistiam, inclusive as dele. Abstraiu todo o universo a sua volta, cantando com seu coração e alma, lembrando de tudo que acontecera, de tudo pelo que lutara e de tudo pelo que passara.

Aquele era seu momento.

            Terminou a música apenas com sua voz, ouvindo a chuva de aplausos que caiu sobre ela assim que luz novamente se apagou. Levantou-se, a emoção tomando conta de si e as lágrimas querendo novamente sair. Reprimiu-as, não querendo borrar sua maquiagem e apenas fez uma reverência, sentindo sua alma lavada ao olhar o rosto tão conhecido agora com um olhar extremamente incrédulo, de alguém que não acreditava no que tinha visto e de que se arrependera do que tinha feito.
Sorriu abertamente para ele, piscando levemente para o menino do sorriso gentil que se encontrava atrás de suas cortinas, murmurando um agradecimento repleto de emoção.

Ali, naquele momento ao som dos aplausos, não mais se sentia pequena e insignificante. Ali as palavras cruéis e o deboche se tornavam ínfimos demais para serem notados e o pilar de sua confiança era finalmente restaurado, feito de um material tão forte e resistente que nada seria capaz de quebrá-lo novamente.

Ali, seu coração quebrado, finalmente voltava a ser inteiro.

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